21.10.05

Procura-se um amante

Muitas pessoas têm um amante e outras gostariam de ter um.
Há também as que não têm, e as que tinham e perderam. Geralmente são essas últimas as que vêem ao meu consultório para me contar que estão tristes ou que apresentam sintomas típicos de insonia, apatia, pessimismo, crises de choro ou as mais diversas dores.

Elas contam-me que as suas vidas transcorrem monotonamente e sem perspectivas, que trabalham apenas para sobreviver e que não sabem como ocupar seu tempo livre. Enfim, são várias as maneiras que elas encontram de dizer que estão simplesmente a perder a esperança.

Antes de me contarem tudo isto, elas já tinham visitado outros consultórios, onde receberam as condolências de um diagnóstico firme: "Depressão", além da inevitável receita do anti-depressivo do momento. Assim, após escutá-las atentamente, eu digo-lhes que elas não precisam anti-depressivos; digo-lhes que elas precisam de um amante!

É impressionante ver a expressão dos olhos delas ao receberem o meu veredicto...
Há as que pensam: "Como é possível que um profissional se atreva a sugerir uma coisa dessas?!"
Há também as que, chocadas e escandalizadas, se despedem e nunca mais voltam. Àquelas, porém, que decidem ficar e não fogem horrorizadas com o meu conselho, eu explico o seguinte:

Amante é "aquilo que nos apaixona". É o que toma conta do nosso pensamento antes de pegarmos no sono e é também aquilo que, às vezes, nos impede de dormir. O nosso amante é aquilo que nos mantém distraídos em relação ao que acontece à nossa volta. É o que nos mostra o sentido e a motivação da vida. Às vezes encontramos o nosso amante no nosso parceiro, outras, em alguém que não é o nosso parceiro mas que nos desperta as maiores paixões e sensações indescritíveis.

Também podemos encontrá-lo na pesquisa científica ou na literatura, na música, na política, no desporto, no trabalho quando é vocacional, na necessidade de transcender espiritualmente, na boa mesa, no estudo ou no prazer obcessivo do passatempo predileto... Enfim, é "alguém" ou "algo" que nos faz "namorar" a vida e nos afasta do triste destino de "durar".

E o que é "durar"? Durar é ter medo de viver. É o vigiar a forma como os outros vivem, é o deixar-se dominar pela pressão, perambular por consultórios médicos, tomar remédios multicoloridos, afastar-se do que é gratificante, observar decepcionado cada ruga nova que o espelho mostra, é a preocupação com o calor ou com o frio, com a umidade, com o sol ou com a chuva.

Durar é adiar a possibilidade de desfrutar o hoje, fingindo contentar-se com a incerta e frágil sugestão de que talvez possamos fazer amanhã.


Dr.Jorge Bucay numa tradução do original "Hay que buscarse un amante"
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4 Comments:

Blogger [ momentos ] said...

assino por baixo.

mas para andar apaixonado, e disfrutar o que de bom podemos tirar da vida, é preciso ter estabilidade para viver fora da paixão.
senao nao e uma paixao: é uma droga que nos ilude.
entendes a importancia da "norma"?

5:28 da tarde  
Blogger mfc said...

Andar-se apaixonado é sempre um óptimo remédio! E ainda há quem não acredite nisso...

5:20 da tarde  
Blogger ccc said...

entendes que essa junção de factores dá lugar ao chamado amor? Não que a paixão se anule mas precisamos da realidade, estabilidade...vou começar a divagar...Parou!!!

beijo

3:54 da tarde  
Blogger ccc said...

Mfc, quantos desconhecem tal emoção? é uma pena.

3:55 da tarde  

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